sábado, 1 de maio de 2010

Jogo da Confiança

Um grupo de pesquisadores suíços liderado por Ernst Fehr fez um experimento — hoje conhecido como o “jogo da confiança com vingança” — que revela muito sobre o que leva alguém a querer dar o troco. O jogo funciona assim: você e um parceiro anônimo recebem R$ 10 cada um. Você começa — ou seja, precisa optar entre ficar com o dinheiro ou dá-lo a seu parceiro. Se resolver embolsá-lo, cada um recebe R$ 10 e o jogo acaba. Se mandá-lo ao outro, os organizadores do jogo quadruplicam a quantia. Resultado? Seu parceiro fica com R$ 50. A pergunta, óbvia, é a seguinte: por que você abriria mão dos R$ 10 para começo de conversa? A resposta é que acredita que dá para confiar no parceiro, que fará a jogada seguinte. No caso, essa pessoa pode optar por ficar com os R$ 50 — e deixá-lo com nada — ou devolver R$ 25 a você, para que os dois dividam igualmente o butim.
Se agisse de forma racional, pensando no próprio interesse, seu parceiro jamais lhe daria os R$ 25. Ciente disso, e agindo de forma igualmente racional, você não lhe enviaria os R$ 10 lá do início. Ou seja, não faria nada — e fim de conversa. A boa notícia é que as pessoas exibem mais confiança e mais capacidade de retribuir do que a teoria econômica convencional nos levaria a crer. No experimento, muita gente passou à frente os R$ 10, e muitos outros retribuíram devolvendo R$ 25 ao parceiro.
Mas o jogo suíço não acabou ali. Se o parceiro resolvesse embolsar os R$ 50, você teria a oportunidade, na fase seguinte do jogo, de usar parte do próprio dinheiro para puni-lo. Para cada real que gastasse, aquele parceiro ganancioso perderia dois. Logo, se decidisse gastar R$ 25, o parceiro perderia tudo o que ganhara. Seria de supor que alguém que tivesse acabado de perder dinheiro relutasse em perder ainda mais só para “dar o troco”. Neste momento, no conforto de sua poltrona, o leitor talvez não entenda esse sentimento. Mas a maioria das pessoas a quem foi dada a oportunidade aplicou um pesado castigo ao parceiro mesquinho.
Essa descoberta não foi a parte mais interessante do estudo, no entanto. Enquanto os participantes tomavam uma decisão, seu cérebro estava sendo examinado com a ajuda da tomografia por emissão de pósitrons (PET). Foi observada atividade no estriato, a parte do cérebro associada à sensação de recompensa. Em outras palavras, a decisão de punir um parceiro ganancioso parecia estar ligada a uma sensação de prazer. Além disso, quanto maior a atividade observada no estriato, maior o castigo aplicado ao parceiro. Isso sugere que o desejo de vingança, ainda que nos custe algo e seja totalmente irracional (a pessoa não tinha ideia de quem era o parceiro e nunca voltaria a encontrá-lo), tem raízes biológicas.

Dan Ariely (dandan@duke.edu) é titular da cátedra James B. Duke Professor of Behavioral conomics na Duke University, nos EUA. É autor de Previsivelmente Irracional (Campus, 2008).



Por Érika Palma

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